Ljubomir Stanisic não conseguiu disfarçar o “gostinho especial” que tem pelos madeirenses. Não admira que tenha colocado tudo o que o distingue ao serviço de que quem foi ao Castanheiro Boutique Hotel esta sexta-feira, ávido de surpresas gastronómicas, alguns autógrafos e várias selfies, mas que agora guarda na memória os encantos de uma experiência que combinou tradições insulares com a irreverência ‘tugoslava’, sabores nossos com a criatividade reconhecida, a excelência do produto apanhada de véspera com a arte de transformar quase tudo o que mexe em motivo de celebração.
O menu de degustação integrado no projecto ‘À Mesa no Castanheiro, Chef Maurício Gonçalves convida…’ trouxe o ‘100 Maneiras’ até ao restaurante Tipografia, homenageou os produtos da Madeira e foi uma espécie de volta à ilha do mar à serra em que ao prato chegou, em nove momentos, muitos dos sabores que nos falam da existência colectiva, nalguns casos sofrida e menos turística, em forma de manteiga de lapas ou de requeijão do Santo, com novas versões do porco da festa ou com esplendor de sempre do peixe apanhado de véspera.
As expectativas eram altas para os 60 entusiastas que, num ápice, esgotaram a capacidade do evento quando o mesmo foi anunciado. À saída, a satisfação era evidente. Sobretudo porque o jantar único que combinou produtos e tradições da ilha com a cozinha e vinhos do chef mediático e a sua equipa foi feito com alma, não se limitando uma reprodução do que se faz em Lisboa. Ljubomir Stanisic e Manuel Maldonado, chefe executivo do grupo 100 Maneiras, conseguiram comprovar que, por exemplo, foram à pesca e que estudaram a lição da autenticidade, que descobriram os encantos das ‘jacas’ e mergulharam nas especificidades das ilhas, concebendo um menu único que combina a essência e as origens com “a abordagem irreverente e ousada que é marca do grupo 100 Maneiras”.
Nove momentos
O repasto arrancou com um ‘Bem-vindos à Bósnia’, que por sinal é o primeiro momento de todos os menus degustação servidos no estrelado restaurante ‘100 maneiras’ em Lisboa e que, no Castanheiro, contou com inspiração madeirense, juntando na mesma mesa especialidades de leste como pão ‘rosa’ – em homenagem à mãe de Ljubomir - ajvar, kajmak, pasteta e stelja mas também uma regionalíssima ‘manteiga’ de lapas.
Seguiram-se entradas diversas. ‘Feel the Beet’ (beterraba fumada e em pickle, com emulsão de aneto), ‘Black Hole’ (choco, cenoura, chalotas, pimento vermelho e achiote), ‘Charuto de Sarajevo’ (espuma de batata, pão de chá fumado e ‘tabaco’ duvan čvarci) e ‘Salada Mista’ (anchovas, trufa, parmesão e pó de framboesas) foram pratos que viajaram do menu do 100 Maneiras para o Castanheiro, mais ou menos transformados com toque regional, deixando que quem se senta às mesas do Funchal nessa noite possa permitindo também viajar até ao número 39 da Rua do Teixeira, no Bairro Alto, em Lisboa.
Estava criado o contexto para os momentos mais arrojados e que coloram à mesa as criações exclusivas, usando os produtos locais. No ‘Crab My Curry’, considerado por muitos como “o prato” da noite, as ‘jacas’ da costa passaram de pequenos caranguejos envoltos em caril verde a estrelas do jantar. Seguiu-se o ‘Terra à Vista’, com o peixe apanhado na véspera pelos chefs de serviço, acompanhado de espinafres e dashi e a ‘Miss Piggy’, feito de porchetta de leitão, topinambur, pimento vermelho e batata trufada. Por fim, já com três horas de viagem, surgiu a sobremesa ‘Santo Queijo’, composta por espuma de requeijão do Santo da Serra e pitangas.
Vinhos especiais
O jantar foi bem regado, com destaque para a “harmonização de vinhos especialíssimos”, escolhidos e servidos por Nuno Faria, o madeirense que é um dos sócios do grupo 100 Maneiras e responsável pela área das bebidas e que, com António Maçanita, lidera do projecto ‘Companhia de Vinhos dos Profetas e dos Villões’, que produz vinhos no Porto Santo e na Madeira e que colocou à mesa o Verdelho dos Vilões de 2023, o Tinta Negra dos Vilões de 2022 e o Caracol dos Profetas de 2022. Brilharam ainda os vinhos Mestiço, nova marca de vinhos lançada por Ljubomir no passado mês de Abril e que foram apresentados na Blandy´s durante a semana e sobretudo o late harvest 100 Maneiras, denominado ‘Mais Vale Tarde do que Nunca’, de 2015, produzido em parceria com a Real Companhia Velha, no Douro.
Francisco Correia era um administrador feliz com o evento “arrojado” e que mantém o Castanheiro no patamar da qualidade. Primeiro porque honra o empenho dos seus pais em erguer o hotel, obra que a família se esforça por dar continuidade. Segundo entende que o repasto foi “brutal”. Terceiro porque acredita que a parceria com o ‘100 maneiras’ é para continuar’.
De facto, esta não foi a primeira vez que o chef Ljubomir Stanisic cozinhou na ilha da Madeira. Já o tinha feito em 2015, no âmbito do programa Rota das Estrelas, a convite do chef Benoît Sinthon, do também estrelado restaurante Il Gallo d’Oro. Contudo, foi a primeira vez que trouxe a estrutura do ‘100 Maneiras’ contribuindo assim para um evento memorável. Volte sempre!