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Antologia portuguesa de poesia homoerótica reúne 101 poemas do séc. XIII até hoje

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Uma antologia "pioneira" de poesia homoerótica, que reúne 101 poemas de 101 poetas, clássicos e contemporâneos, que oferece uma perspetiva abrangente sobre as representações do homoerotismo na poesia desde a Idade Média foi recentemente publicada pela editora Avesso.

Organizada pelo jornalista, tradutor e editor Vladimiro Nunes e pelo escritor e professor universitário Victor Correia, a obra, que toma o título "O tamanho do nosso sonho é difícil de descrever: antologia do homoerotismo na poesia portuguesa", inclui pinturas e desenhos de Cruzeiro Seixas.

"Representativa das diversas correntes, a seleção privilegia o valor histórico e literário dos textos, procurando revelar a forma plural como homens e mulheres têm abordado em verso, independentemente (ou não) das próprias vivências, o amor entre pessoas do mesmo sexo", afirmam os organizadores.

No prefácio da obra, explicam que "tal como um poeta homossexual não tem de escrever poesia homoerótica, nada impede que autores heterossexuais abordem o homoerotismo nos seus versos", como foi o caso de Sophia de Mello Breyner Andresen, Jorge de Sena, David Mourão-Ferreira ou Herberto Helder, entre outros, constantes nesta compilação.

Essa foi a razão por que os autores, que tomaram como referência, em termos estilísticos, a "Antologia de Poesia Erótica e Satírica", com seleção, prefácio e notas de Natália Correia, escolheram usar como subtítulo "homoerotismo na poesia portuguesa" em vez de "poesia portuguesa homoerótica".

A primeira metade do livro corresponde, sensivelmente, aos clássicos, enquanto a segunda, iniciada com Fernando Pessoa, concentra os modernos e contemporâneos.

O poemas são apresentados por ordem cronológica (atendendo ao ano de nascimento do autor) e cada um é precedido de um verbete biográfico.

Em Portugal, os mais antigos testemunhos literários sobre homossexualidade encontram-se nos cancioneiros medievais galaico-portugueses -- o Cancioneiro da Biblioteca Nacional, o Cancioneiro da Biblioteca da Ajuda, e o Cancioneiro da Biblioteca Vaticana -- de onde Victor Correia e Vladimiro Nunes recolheram e traduziram para português contemporâneo as 15 composições iniciais da antologia.

Os responsáveis pela obra destacam que estes poemas iniciais são maioritariamente jocosos, embora vários não assumam uma atitude condenatória, limitando-se a brincar com a situação narrada.

"Para lá da crítica enquanto afirmação de masculinidade ou reflexo de homofobia internalizada, a sua abundância revela, no mínimo, interesse reiterado pela temática. Outros denotam uma certa simpatia para com os homossexuais, detalhando sem julgar as suas aventuras amorosas", acrescentam.

Victor Correia e Vladimiro Nunes referem ainda que muitos expressaram, com diferentes graus de exposição, os seus sentimentos homoafetivos e homoeróticos, enquanto outros abordaram o tema enquanto observadores, criando personagens ou evocando figuras da história, da mitologia e da literatura, exaltando corpos ou celebrando afetos entre semelhantes, jogando com a ambivalência sexual.

Os organizadores chamam ainda a atenção para a escassez de autorias femininas: Se na primeira metade do volume a escassez (apenas cinco mulheres em 50 autores) será compreensível, atendendo ao contexto das épocas, nada justificava que, entre os contemporâneos, não se aproximasse de um objetivo paritário (17 mulheres em 51 autores).

Aos poemas junta-se ainda, "em jeito de homenagem", uma seleção de pinturas e desenhos de Cruzeiro Seixas, que se definia como "um homem que pinta" e cujo imaginário se ligou profundamente ao homoerotismo, no exercício da liberdade artística e sexual preconizada e vivida pelos surrealistas.